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182) Carta a Cristiano Frederico Samuel Hahnemann, o fundador da Homeopatia, nascido em 10 de Abril de 1755.
Carta atualizada em 05 de abril de 2011.
Prezado Hahnemann,
Talvez no teu caso eu tenha, de fato, boas novidades para anunciar. A primeira delas refere-se à não aceitação da tua homeopatia pelos órgãos científicos oficiais. A difusão da terapêutica que descobriste faz-se de forma natural e espontânea entre o povo, que geralmente se revela capaz de ver os resultados, sem exigir que a cura esteja dentro das normas ou decretos da ciência.
A classe médica de alguns países teve o privilégio de abraçar a tua visão da medicina com bastante entusiasmo, como ocorreu na Índia e, mais recentemente, no Brasil, apesar destes profissionais sofrerem ainda certa discriminação pelos demais colegas. Então, enquanto a homeopatia é apenas permitida pelas autoridades, como um favor que se concede ao povo e a uma minoria de profissionais da área de saúde, vejo grandes possibilidades dela conservar intactos os princípios básicos que a compõem - tu sabes que as concessões mutiladoras são freqüentes quando se quer atingir um determinado status.
A grande maravilha que sucede neste final de milênio atende pelo nome de informática ou computação e a homeopatia está tirando um enorme proveito dessa onda. Quando se selecionam alguns sintomas característicos do paciente para ver quais os medicamentos que melhor se ajustam ao caso, o computador nos faz isso em poucos segundos, melhorando sensivelmente a performance do médico. Há diversos programas destinados ao homeopata e alguns possuem no seu banco de dados, quase toda a literatura clássica homeopática - é claro, com todos os teus livros.
Por falar nisso, existem também no nosso meio homeopático, alguns apologistas do teu trabalho. Acham que o fenômeno saúde e enfermidade está contido no que escreveste. Mas, suponho que já sabes que algumas hipóteses tuas foram descartadas e, portanto, há muita coisa para se pesquisar e descobrir nos fenômenos homeopáticos. Entretanto, a base científica que estabeleceste, a qual exige que uma substância para ser usada como medicamento deve ser primeiramente ingerida por pessoas sadias, permanece válida até hoje. Além disso, os sintomas que surgem nesses experimentadores representam os indicadores terapêuticos dessa mesma substância, o que é um fato comprovado na prática diária de todo homeopata. Porém, a grande diferença entre a medicina convencional e a homeopatia parece residir não na diluição – porque os pacientes respondem de forma ampla e profunda ao uso de preparações pouco diluídas – e sim no conhecimento que o homeopata dispõe dos efeitos sutis e individualizantes da medicação, bem como dos traços peculiares do enfermo, e por ajustar um ao outro de forma global. Portanto, o medicamento químico não é nocivo – como supuseste – mas apenas limitado, pois sua utilização não contempla todos os efeitos terapêuticos da substância. Contudo, eles não deixam de ocorrer, e são taxados de adversos ou colaterais. Além disso, estes às vezes superam os efeitos necessários e desejáveis, fato que raramente acontece na homeopatia, na qual o remédio é escolhido de acordo com o conjunto de efeitos provocados em experimentadores sãos.
Teu grande trunfo é que os teus seguidores ainda não se organizaram em nenhuma instituição duradoura. Como sabes, elas tendem ao autoritarismo quase irreversível, como uma praga maligna. Atualmente, nossa candidata a ser o teu Vaticano, nas terras elogiadas por Pero Vaz de Caminha é a Associação Médica Homeopática Brasileira – AMHB.
Alguns discípulos teus empenham-se muito na possibilidade de convencerem os cépticos quanto à cientificidade dos medicamentos diluídos. Mas, tu sabes que se eles não acreditam nas curas promovidas pelos remédios homeopáticos, tampouco valorizarão os protocolos de pesquisa, por mais bem elaborados que sejam em relação às normas da pesquisa científica. Seria muito bom que estes homeopatas pudessem meditar na parábola do rico e Lázaro, onde Jesus descarta qualquer iniciativa para se ajudar aos incrédulos. (Lc, 16:19-31)
De forma geral, modificou-se pouco a situação da medicina desde quando enfrentaste as tormentas desencadeadas por tuas críticas ao sistema vigente no início do século XIX. A diferença parece-me reduzida a um estupendo foguetório da ciência. Por mais incrível que pareça, até hoje tratam um doente como se as disfunções ou lesões físicas não tivessem nenhuma relação com suas emoções. A tecnologia faz proezas que até Deus duvida, no entanto, o pobre ser humano continua ignorando que toda enfermidade tem as raízes em seu próprio temperamento – a medicina desconhece que os sintomas clínicos são a expressão orgânica do quadro emocional do paciente. Órgãos são substituídos por outros ou por próteses através de recursos brilhantíssimos, mas o indivíduo prossegue tão desequilibrado quanto antes. Cultua-se a técnica como a maior divindade de nossos tempos e o potencial de cura que existe dentro de nós mesmos fica totalmente desprezado.
Como ilustração, gostaria de relatar-te o caso de um antigo vizinho meu. Encontrei-o, certo dia, próximo às nossas casas e estranhei-lhe o semblante, tal o abatimento e a tristeza. Em poucas palavras, sintetizou-me que na condição de funcionário público fora submetido a exames laboratoriais de rotina, como ocorria todos os anos na instituição em que servia, e o resultado da investigação mostrara que seus rins não estavam funcionando. Perguntei-lhe sobre a existência de sintomas anteriores aos procedimentos de laboratório e a resposta foi negativa. Nada. Nenhuma alteração até aquela data. Mas, o médico não deixara a menor sombra de dúvida - os rins dele não funcionavam mais.
Em escassos segundos, concluí comigo mesmo que se quisesse ajudar aquele molambo humano, eu teria que jogar duro. E disse-lhe: quem saberia mais sobre ele, o seu próprio organismo ou os exames? Como poderia ele não estar bem, se até o momento não sentira nenhuma perturbação, trabalhava normalmente no emprego e, à noite, ainda tinha forças para lidar na construção de sua própria casa? E ainda refletia com ele: Se você nunca sentiu nada e continua urinando regularmente, isto não significa que os seus rins estão funcionando?! Entretanto, curvado sob a depressão que o esmagava, murmurou: é, mas o médico disse-me que eles podem parar a qualquer momento...
Foi aí que me dei conta, Hahnemann, de que eu estava lutando contra o que se chama, atualmente, de onipotência médica. Passei a mão pela cabeça na busca de um último cartucho, e questionei: quem sabe o teu organismo já se encontra nesse estado há muito tempo, só que você não sabia ainda? Nesse caso, ele pode permanecer assim por muito tempo mais... Falei-lhe que quando isso ocorre, há uma adaptação de todo o sistema fisiológico e, por isso, algumas pessoas não mais suportam conviver com os valores considerados normais, porque, para elas, tornaram-se anormais.
Encontramo-nos diversas vezes nos dias seguintes, conversávamos um pouco, porém o estado psicológico dele era lastimável. Olheiras acentuadas, vestia-se com desleixo e caminhava como se fosse afundar-se solo adentro. Algumas semanas depois, tive a surpresa de vê-lo melhor disposto, novamente com a expressão jovial de antes do cataclismo, dizendo-me que o médico realmente estava certo - seus rins haviam parado de funcionar, de repente. Submetia-se, agora, à hemodiálise duas vezes por semana e estava preparando documentos para sua aposentadoria.
Parece-me, Hahnemann, que a medicina desenvolveu muito os recursos tecnológicos capazes de auxiliar no diagnóstico e na terapêutica, todavia a concepção de cura encontra-se quase no mesmo nível que tu viste. Não seria diferente com a área médica, já que a moral, a ética e a religião continuam avessas ao progresso... O ser humano ainda faz guerras terríveis por questões étnicas ou por divergências de fé. Mas, como à ciência atribui-se o papel de nova dona da verdade, as pessoas depositam-lhe cega confiança. Tornam-se desse modo vítimas fáceis de uma medicina caríssima, pouco preventiva e ignorante em demasia quanto às causas mais profundas da enfermidade humana.
Ela tem os seus méritos e eu já os destaquei alhures[1]. Hoje estamos focalizando a banalização da enfermidade e da cura, tão explorada pelos mercenários que divulgam as descobertas científicas como pérolas magníficas e escravizam os hipnotizados a pagamentos mensais que garantam o acesso a tais maravilhas, se porventura necessário. Se a saúde humana é uma graça de Deus e a medicina um templo onde se busca a religação com a sanidade, vejo em tua luta contra a hipocrisia uma atitude semelhante à do Cristo, expulsando os vendedores do templo de Salomão (Mc, 11:15).
Talvez, Hahnemann, seja esta a razão oculta para as restrições impostas à homeopatia: ela é barata e eficaz, portanto, não se ajusta à exploração financeira, atrapalhando os grandes grupos econômicos que fazem da enfermidade humana uma autêntica mina de ouro. Neste mundo, ainda vivemos sob o império do lucro; o que não gera polpudos dividendos não presta.
Uma cura rápida e pouco onerosa seria um verdadeiro desastre social - milhões de profissionais desempregados, milhares de pesquisadores sem rumo e quanta grana, meu amigo, quanta grana poderia ser redistribuída! Acima de tudo, quanta felicidade a mais na vida das pessoas! Quando veremos isso, Hahnemann? Falta muito?
Do amigo
Gilberto Ribeiro Vieira
[1] Vide Evangelhoterapia – Editora Ground, deste autor, disponível em http://www.cesaho.com.br/biblioteca_virtual/livro.aspx?l=23
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Photos courtesy of Dr Denis Casey.
http://www.homeoint.org/photo/hahnema17.htm#176.
Inserido no site em 06/04/2011
Veja mais em: http://www.cesaho.com.br/biblioteca_virtual/livro.aspx?l=23
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